O
que são Unidades de Conservação – Ucs APA E RESEX Delta do Parnaíba?
Antes
de qualquer discussão sobre UC, precisamos contextualizar esse universo da
política; ações para que chegássemos às unidades de conservação como temos atualmente.
Assim,
precisam-se voltar às discussões no início de 1976, num trabalho denominado
“Uma análise de prioridades em conservação da natureza na Amazônia”, que
fundamentou a elaboração do Plano do Sistema Nacional de Unidades de
Conservação do Brasil, publicado entre 1979 e 1982.
Na sequência das ações
sobre conservação, em 1981, foi instituída a Política Nacional do Meio
Ambiente, estabelecendo como princípio, “a ação governamental na manutenção do
equilíbrio ecológico, considerando o meio ambiente como um patrimônio público”.
Ainda em 1981, foi criado o Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA – e o
Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA. Que se consideram a base sobre o
assunto e abrem caminhos para que outras ações pudessem acontecer nesse âmbito da
conservação da Natureza como um patrimônio vivo e para o bem viver das pessoas
nos territórios relacionados às UCs.
Deste modo as UCs, quando
criadas, têm como objetivos garantir os atributos ecossistêmicos em uma
determinada região, seja em áreas terrestres ou marinhas, buscando a manutenção
socioambiental nesses lugares conforme o tipo de unidade de conservação criada.
Neste sentido, o Brasil
conseguiu concretizar a aprovação da Lei nº 9.985, de 18 de julho 2000,
instituindo o Sistema Nacional de Unidades de Conservação o (SNUC), o qual
abrange as unidades brasileiras, sendo, portanto, o instrumento legal das UC`s,
tanto em questões de criação, implantação e controle, como no tocante à gestão
destas (BRASIL, 2000). Esta Lei foi um grande passo para concretizar e proteger
áreas naturais do País, território onde habita a maior concentração de
biodiversidade do planeta.
O
SNUC proporcionou uma grande integração no sentido de aglutinar todas as
Unidades de Conservação, nos âmbitos, federal, estadual e municipal. A responsabilidade
da concretização destes objetivos está na jurisdição do Conselho Nacional de
Meio Ambiente, o qual deve acompanhar a implementação do SNUC, sob a
coordenação do Ministério do Meio Ambiente e do Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade – ICMBio – o qual, desde 2007, assumiu a gestão
das unidades de conservação federais até então sob a responsabilidade do
Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis –
IBAMA.
Contudo, o SNUC tem ainda
grandes gargalos futuros para sua real efetivação na prática, embora grandes
passos já tenham sido dados, objetivando relações mais harmoniosas entre o meio
ambiente e desenvolvimento social e econômico do Brasil. Questões como:
assegurar a sustentabilidade financeira do SNUC; dotar o mesmo com pessoal, em
número e qualificação adequados; providenciar a regularização fundiária das
unidades de conservação, são pautas que ainda estão sendo resolvidas para sua
consolidação.
Este mesmo Sistema dividiu
as UC`s em duas categorias de uso: Proteção
Integral e de Uso Sustentável,
ficando classificadas como as de Proteção Integral: Estação Ecológica, Reserva
Biológica, Parque, Monumento Natural e Refúgio de Vida Silvestre (BRASIL,
2000). Estas UCs de proteção integral são, em sua maioria, localizadas em
ambientes de grande importância ecológica, tendo também uma fragilidade: a
significativa intervenção humana sobre estas, que deve ter uma atenção e
restrição especial do uso, tanto do ponto de vista do bem-estar da natureza
como para não causar desequilíbrios nestes ambientes.
As UCs de Uso Sustentável, por sua vez, são: Área de Proteção Ambiental -APA, Área de Relevante Interesse Ecológico, Floresta Nacional, Reserva Extrativista -RESEX, Reserva de Fauna, Reserva de Desenvolvimento Sustentável e Reserva Particular do Patrimônio Natural (BRASIL, 2000). Nessas unidades, como o próprio nome sugere, é permitido o uso sustentável dos recursos naturais, desde que de forma controlada e monitorada, com preocupação de uso para as futuras gerações, como é caso das UCs APA e RESEX do Delta do Parnaíba.
Sendo
que as ações têm que ser de baixo impacto ao meio ambiente. Assim, é que quando
se têm atividades “incompatíveis” com os objetivos das UCs criadas a partir das
características do ecossistema, essas atividades socioeconômicas são
gradativamente extintas desses territórios protegidos, pois elas colocam em
risco toda manutenção do ecossistema qual a UC foi definida, conforme seu
regime de gestão e de aspectos legais.
APA Delta do Parnaíba: é uma UC federal criada em 1996,
tendo quase 25% do território composto por águas jurisdicionais e com uma
população de aproximadamente de 360.000 habitantes (ICMBio, 2020). APA Delta do
Parnaíba abrange três estados nordestinos: Ceará, tendo áreas dos municípios
dentro da UC (Chaval e Barroquinha); Piauí, tendo áreas dos municípios dentro da
APA (Cajueiro da Praia, Luís Correia, Parnaíba e Ilha Grande) e; Maranhão tem
áreas dos municípios dentro da Unidade (Araioses, Tutóia, Água Doce, Paulino
Neves).
No
interior da à APA Delta do Parnaíba encontram-se três outras UCs: APA da Foz do
Rio Preguiças - Pequenos Lençóis, UC do estado do Maranhão que ocupa quase 40%
de seu território; a Reserva Extrativista (RESEX) Marinha Delta do Parnaíba, UC
federal, ocupando cerca de 9% do seu território e a RPPN Ilha do Caju,
equivalente a menos de 0,04% de sobreposição. A região do Delta do Parnaíba
possui vegetação de tabuleiros, restingas, manguezais, mata ciliar de várzeas e
vegetação sobre dunas (IBAMA, 1999). A APA está localizada entre áreas de
Cerrado e Caatinga, e é sujeita a forte influência amazônica na sua porção
maranhense (KJERFVE & LACERDA, 1993).
Além
disso, possui uma zona costeira constituída por um sistema contínuo de
manguezais, com o aporte de grandes quantidades de água doce, provenientes de
extensos rios e igarapés e altas variações de amplitudes de maré.
A
pesca é fonte de saberes, fazeres, de alimento e renda para os moradores das
comunidades da APA Delta do Parnaíba, que tem nessa atividade, a mais
significativa atividade econômica e de fonte de renda para milhares de
moradores nesse território dentro dos três estados CE, PI e MA.
Além
disso, a pesca se caracteriza por ser principalmente artesanal e utilizar
diferentes artes de pesca, conforme as regiões e recursos pesqueiros visados. É
uma atividade tradicional, passada de pais para filhos, assim como os
conhecimentos associados à sua prática e experiência, que estabelece uma
relação intrínseca homem e a natureza.
Outras atividades tradicionais significativas como a agricultura familiar, a
criação de animais, o extrativismo de sementes e frutos, também dependentes dos
ciclos das chuvas, estão associados à subsistência e à segurança alimentar das
famílias, muitas vezes complementando a renda de outras atividades como a
pesca.
O
funcionamento de portos, exploração de calcário, artesanato, desembarque e
quebra de caranguejo, piscicultura e carcinicultura, salinas e empreendimentos
de energia eólica também são atividades que ocorrem na UC. A APA Delta do
Parnaíba faz parte do roteiro turístico Rota das Emoções, que abrange ainda o
Parque Nacional de Jericoacoara, no Ceará e o Parque Nacional dos Lençóis
Maranhenses, no Maranhão. Esse roteiro integrado possibilitou uma ampliação do
fluxo de visitação nessas unidades, no entanto, como toda atividade
socioeconômica dentro de territórios sensíveis do ponto de vista ambiental, é
preciso que seja feito um constante acompanhamento, pois existem conflitos e
sobreposições com atividades tradicionais quando o turismo não é bem planejado
e executado.
Com
essa diversidade de atividades, atores e ambientes na região que abrange a APA
Delta do Parnaíba, têm diversos conflitos, jogos de interesses que muitas vezes
sobreposições de atividades, ocasionando assim perdas para uns, concentração de renda para outros e danos
ambientais muitas vezes irreversíveis ao ambiente que é Delta do Parnaíba, pois
o Delta é uma metamorfose de vida e transformações naturais pelas movimentações
de sedimentos (areia, material orgânica) que vem descendo do Rio Parnaíba até o
Atlântico, criando muitas dunas, ilhas e vida nesse imenso Delta. Deste modo, a
necessidade de disciplinar as ações antrópicas nesse território ou criando UCs
para conserva-lo.
Assim,
é preciso participação de todos e todas na gestão do território, seja ele
unidade de conservação ou em uma cidade. É chave que todos os entes, sejam
eles: federais, estaduais, municipais e terceiro setor possam agir, participar,
monitorar e fiscalizar. Não só na
temática de UCs, mas de todos os assuntos, necessidades que têm efeitos sobre a
vida das pessoas e do meio ambiente.
Um
exemplo que é preciso uma atuação firme da sociedade, que não teve-se, pois a APA
Delta demorou 24 anos para ter seu instrumento de gestão base (Plano de
Manejo). O plano que dará condições para uma melhor tomada de decisão, tendo
somente sua elaboração concluída em 2019 e publicação em 2020. Sendo o que
consta no SNUC é que UC tem 5 (cinco) anos para ter um plano após sua criação. No
entanto, faltam recursos, pessoal, pressão social, etc.
Além disso, falta priorização sobre a pauta da política socioambiental brasileira. Isso mostra que os desafios foram e serão enormes para conservação do território dessa UC, sendo fundamental uma participação ativa de todos para bem comum do território e das gerações futuras no Delta do Parnaíba.
As Reservas
Extrativistas – RESEXs
são caracterizadas principalmente por ser uma área utilizada por populações
tradicionais que praticam extrativismo, pesca
agricultura familiar e criação de animais de pequeno porte, seu objetivo
é proteger os meios, modos de vida e a cultura dessas populações, e assegurar o
uso sustentável dos recursos naturais da unidade de forma equilibrada homem e a
natureza.
Nesse
contexto, para garantir a exploração autossustentável e a conservação dos
recursos naturais renováveis tradicionalmente utilizados pelas populações
extrativistas da região do Delta do Rio Parnaíba foi criada a Reserva
Extrativista Marinha Delta do Parnaíba, através do Decreto S/N de 16 de
novembro de 2000, sua área pertence aos municípios de Ilha Grande, Estado do
Piauí, e nos Municípios de Araioses e Água Doce, Estado do Maranhão, sendo que
95% estão em áreas do maranhense e demais 5% em território piauiense. Seu ecossistema característico é o manguezal
e seus habitantes, vivem basicamente da extração do caranguejo uçá, da pesca
artesanal, coleta de moluscos, da agricultura familiar, frutos, turismo e criação de animais em pequena
escala, pois não é permitido criações de animais de grande porte dentro de
Resex, conforme o que consta na legislação. Mesmo tendo gado ainda dentro da
Resex, pois era uma atividade econômica anterior a criação da UC. Assim, vem
sendo feito discussões para uma diminuição gradativa do rebanho dentro da
Unidade.
Um
detalhe diferente das APA´s, a gestão das RESEX é feita em cogestão com
ICMBio, através do conselho deliberativo da Unidade, que é diferente do
Conselho de uma APA, que é meramente consultivo. Além disso, os comunitários
através da Associação Mãe da Resex do Delta – AMAR Delta, atualmente são
detentores do Contrato de Concessão do Direito Real de Uso – CCDRU, assinado em
2018 pelo o ICMBio e AMAR Delta.
Esse
contrato permite mais responsabilidades ao território, bem como mais segurança
que o território continuará sendo para as comunidades tradicionais. Outra
característica importante das RESEXs é que não existe propriedade privada
dentro do território, todo o território é de domínio público para usufruto dos
moradores locais da UC de forma sustentável.
Além
disso, a assinatura promoveu a regularização fundiária para as populações
tradicionais, permitindo o acesso às políticas públicas e aos programas
públicos e segurança para realização de benfeitorias voltadas à produção.
Isso tudo, pensando na manutenção dos recursos
naturais e modo de vida dos moradores locais, pois a UC foi criado para
viabilizar a conservação e uso autossustentável dos recursos pelas comunidades
tradicionais e extrativistas.
Além disso, se Delta do Parnaíba ainda se encontra
“conservado” é pelo fato que existe duas UCs nesse território: APA e Resex
Delta do Parnaíba, para, além disso, têm-se centenas de comunidades que dão
vida e buscam do seu jeito de ser, de realizar suas atividades e viverem de
modo mais equilibrado com a natureza.
Ilha Grande – PI, 25 de abril de 2021.
Carta Ilhagrandense.
Dos autores ao povo