A ARTE DO FAZER: MULHERES QUE
CRIAM
Vamos conversar um pouco sobre trabalho feminino?
Vamos conversar um pouco sobre trabalho feminino?
O mês de maio se
inicia com a data de comemoração do dia trabalhadOr (Sim, ênfase para o termo
em masculino), não é de se espantar que esteja no masculino, uma vez que quando
falamos em trabalho, devemos lembrar que durante muito tempo essa foi uma
esfera negada as mulheres, até hoje o trabalho é algo muito desafiador para
elas, sendo que nós enfrentamos todos os dias: desigualdade salarial, assedio,
desvalorização das atividades exercidas, jornada dupla com as atividades
domesticas e cuidado com a família, que são coisas “super” cobradas das mulheres mesmo que trabalhem, poderia falar mais
coisas aqui, mas vamos lá...
Falamos um pouco do
trabalho dito formal, mas existe outras categorias de mulheres que tem seus
trabalhos invisibilizados socialmente, temos as domésticas que muito sofrem com
a desvalorização do seu trabalho, tendo que aceitar péssima remuneração por seu
de serviço, uma vez que a sociedade impõe, qualquer trabalho do lar como
natural à mulher.
Mas isso está mudando né?
E temos muito que melhorar hein!
Uma categoria que
gostaria de enfatizar aqui, são as mulheres que FAZEM; as artesãs que exercem a
arte do CRIAR.
Nossa Ilha é rica na arte do
fazer e do criar, temos mulheres que fazem da palha um lindo trabalho, temos as
marisqueiras e pescadoras que fabricam seus instrumentos de trabalho, como
redes e landuás, a arte da renda tão famosa na nossa cidade, as fazedoras de
doce de caju no Labino e as bordadeiras da Pedra do Sal, e muitas outras.
Ofícios
manuais sempre estiveram presentes na vida das mulheres, mas sempre se teve uma
dificuldade de entendê-los como trabalho! Sim, é um trabalho! Você com certeza
deve conhecer ou mesmo ter alguém na família que faça renda, costure, faça
bordado, faça um doce caseiro, uma rede pesca... Já se perguntou o trabalho e a
dedicação empregada nos trabalho manuais que você conhece?
Conversei com três
mulheres que dominam a arte do fazer um oficio, em uma conversa breve para
entendermos um pouco do trabalho de quem faz algum artesanato, como já foi
falado anteriormente existem muitas mulheres com trabalhos maravilhosos, mas
essas três nos dão um panorama dos seus trabalhos.
Entre todos os
desafios de quem trabalha com artesanato existem ponto em comum, este apresentado
por nossas colaboradoras é a desvalorização do seu trabalho. Dona Norma Sueli
do Bordados Pedra do sal diz que:
“A
maioria não entendem que é um trabalho manual e querem colocar o preço abaixo,
as vezes muito abaixo de um produto industrial!”
Alaíne, que faz parte da geração mais Jovem de
rendeiras de Ilha Grande, também fala da dificuldade em relação a valorização
da renda:
“Às vezes não é muito valorizado, as pessoas querem
que a gente venda a um preço muito abaixo do que nós pedimos, isso é uma
desvalorização, por que passamos semanas fazendo um artesanato que da bastante
trabalho e ser vendido por um preço muito abaixo não é bom.”
Rebeca Andrade idealizadora e proprietária do
Ateliê Alternativo, diz que:
“Há sempre aquela jogada do cliente de colocar preço
no nosso material, sem saber como ele é feito, comprado, planejado, estudado.”
É de pensarmos por que o trabalho
manual é tão desvalorizado?
As artes manuais estão presentes na história desde o começo
de tudo. As primeiras peças de roupas, os primeiros acessórios e as primeiras
ferramentas foram criadas de forma artesanal, a partir das necessidades dos
seres humanos de se protegerem do frio, caçarem seus alimentos e se diferenciarem
uns dos outros na sociedade, mas a sociedade impõe certos padrões que acabamos
internalizando, muitas vezes sem pensar, isso que nos faz entrar em uma loja
famosa, comprar uma marca industrializada famosa, sem nem questionar valor ou
pensar o processo de produção daquela peça, mas ao chegarmos na costureira do
nosso bairro, questionamos o valor do serviço dela.
Esse é um exemplo para que possamos refletir sobre como
muitas vezes nós desvalorizamos o trabalho manual, não é colocar a artesã numa
posição diminuída, pelo contrario é mostrar que todo trabalho é trabalho e quem
o faz tem todo direito de empregar valor a ele, uma fala bastante interessante da
colaboradora Rebeca mostra esse processo de evolução pessoal do trabalho manual:
“Foi
comum no inicio me sentir mal e acabar aceitando o valor do cliente, porém com
tempo eu comecei a trabalhar de forma mais honesta com meus processos”.
É esse o objetivo
desse debate, mostrar que é preciso se apoderar do valor que trabalho tem.
Na historia do trabalho manual, ele se origina dentro do
universo feminino, nossa avós, bisavós, entendem bem esse processo, bordar,
costurar fazer renda não era um trabalho, era algo que fazia parte do ser
mulher, fazer renda para enxoval dos filhos, um pano de prato bordado, enfeites
de casa feito de crochê, costurar roupas para família etc. Perguntei se as colaboradoras sentiam que a
desvalorização do trabalho era pelo fato desse ser feito por mulheres, elas
foram unanimes “não”, dona Norma Sueli até diz que existe um machismo por
dizerem que “Bordado é coisa de mulher”, ai a gente volta lá no que foi dito de
onde surgiu o trabalho manual e fica a pergunta: será que a desvalorização do
trabalho manual vem do valor empregado a ele inicialmente?
Teria muitas coisas a falar aqui sobre artesanato, mas meu
objetivo nesse texto é enfatizar que precisamos aprender a dá valor a esses
trabalhos, valorize a costureira do seu bairro, a mulher que faz vassoura, a
rendeira, a doceira, a boleira, a bordadeira... valorize essas mulheres, em uma
frase que estampa a pagina do Bordadeira da Pedra do sal representa bem aquilo
que queremos dizer “ feito a mão como forma de resistência”, na nossa sociedade
que coloca o papel da artesã como secundário, se apoderar do trabalho manual
como fonte de renda é sim, ser resistente!
E claro que não poderia deixar de falar um pouco das nossas
colaboradoras, porque se tem algo que diferencia o trabalho manual de qualquer
outro produto é a história, por trás das mãos que criam, existe uma história,
história que empregar valor único ao artesanato.
A essas mulheres, que
aqui nesse texto representam muitas outras, meu obrigado e respeito!
Norma Sueli: Bordadeira da pedra do sal.
Sou neta e filha de artesãos, extrativista e pescadores,
sou bordadeira da Pedra do Sal, o bordado vem passando de geração em geração,
eu aprendi com minha mãe, que aprendeu com minha vó, e ensinei minha filha e a
gente vai seguindo para que não se perca, a gente bordava em casa pra gente
mesmo, em 2007 foi que começamos trabalhar o bordado, vejo o trabalho manual
com uma forma de manter a tradição da minha família, sem contar que é belo, amo
o que faço e me orgulho de cada peça criada por mim, sou artesã com muito
orgulho!
Rebeca Andrade: Ateliê Alternativo.
Comecei fazer
turbantes para mim mesma à mão, no começo de 2014, pois estava em processo de
transição capilar. Ao longo do ano muitas pessoas perguntavam quem vendia, onde
eu comprava, sempre diziam a mesma coisa "não acho coisas assim aqui em
Parnaíba". Então resolvi vender pras pessoas próximas, passei a costurar
em máquina doméstica, me aventurando com uma da minha avó, ela me emprestava a
máquina e eu levava meus tecidos. Eu nunca tinha tido contato com máquina de
costura, foi “o desafio”, começar do zero e sozinha. As encomendas começaram a
aumentar e fui fazendo outros produtos. Consegui comprar a minha primeira
máquina. Depois de um tempo de uso, começou a dar problema e comprei a minha
segunda máquina de costura, nova. O que deu início a muitas possibilidades de
costura, e sempre tentando fazer mais pessoas conhecerem o meu trabalho eu
fazia de tudo um pouco, hoje em dia seleciono bem as coisas que posso, sei e
quero fazer, pois de tanto costurar coisas que não queria para ganhar dinheiro,
comecei a ver que não seria feliz assim. O Ateliê tem dado passos grandes do
ano passado para cá e que ele permaneça em pé por muitos e muitos anos!
Alaíne Cristina C. Santos.
Comecei com 10 anos, foi em curso que a prefeitura
disponibilizou. Era meu sonho aprender, mas minha mãe não tinha paciência de
ensinar, surgiu esse curso é ela me colocou, quem presidiu o curso foi a dona
Socorro.
Escrito por: THALITA NASCIMENTO DE SOUZA, Licenciatura Plena em História, pela Universidade Estadual do Piauí.
Ilha Grande - PI, 03 de maio de 2020
Carta Ilhagrandense.
Dos Autores em quarentena.
As trabalhadoras de Ilha Grande
As trabalhadoras de Ilha Grande