terça-feira, 31 de março de 2020

Sobre as Marisqueiras da Ilha



Fotos do arquivo pessoal de Janaina Leocadio.



Por que curtir tanto sol
Enrugar o rosto, calejar as mãos
Navegar com força
E até esquecer os desejos do coração?
Por que navegar é preciso

Poesia “Pescar é preciso” feita por Luzanete Lima, pescadora de Taiba,
 São Gonçalo do Amarante – CE.


Em meio ao que estamos vivendo devido a pandemia do coronavírus, não poderíamos deixar de continuar nossa proposta de homenagear as mulheres ilhagrandenses, por mais que o momento seja difícil.

Hoje vamos falar um pouco sobres as marisqueiras da nossa ilha! Os trechos da entrevista aqui apresentados, são referentes a uma conversa realizada no início de 2019 com dona Luiza, marisqueira conhecida que foi presidente da Associação das Marisqueiras com sede na comunidade Tatus. Nosso texto busca dar foco a essas mulheres que representam todas ilhagrandenses, que com força, vão além de todos os rótulos e toda invisibilidade que as permeia.

            Em nossa região temos figuras bem conhecidas. Nossos pecadores, catadores de caranguejo, que são conhecidos pelo ofício e como resultado do conhecimento dessa categoria, temos a colônia de pescadores, o festival do caranguejo e pelo menos, uma dezena de associações.

Porém, não são somente esses homens que adentram o rio em busca do seu sustento, na Ilha temos mulheres que pescam, e temos também as marisqueiras. Não é de surpreender que o trabalho dessas mulheres não seja tão visto. Vivemos em uma sociedade patriarcal onde a mulher vive silêncios dos seus ofícios, o trabalho feminino é visto como secundário ou apenas uma complementação do trabalho masculino, tendemos a invisibilizar as mulheres.

Elas saem sedo de casa, carregam as canoas com os instrumentos de trabalho, sendo o mais importante o Landuá, adentram o rio atentas as marés e quando chegam no local propício enfrentam o sol, sentadas na lama catando o marisco.

 Abrindo um parêntese para a experiência que tive ao vivenciar esse momento junto as marisqueiras, só posso dizer que tenho todo respeito e admiração por esse ofício, que mostra o quanto a expressão “sexo frágil”, é um clichê de pessoas que jamais olharam para além da própria realidade, que o trabalho delas deveria ser bem mais valorizado, que diminuir o ato de mariscar é  algo de imensa ignorância, e essas mulheres depois de enfrentarem um dia de sol e trabalho, fazem jornada dupla cuidando dos seus lares.”

Thalita Nascimento de Souza, historiadora pela UESPI- Parnaíba, colaboradora do Carta Ilhagrandense.

O grupo das marisqueiras já existe a bastante tempo em Ilha Grande e o ato de mariscar é ancestral, nesse grupo muitas mulheres buscam o sustento da família por meio da cata do molusco. Durante a conversa com dona Luiza, ela nos fala sobre a importância da renda para as mulheres, “O marisco é um dinheiro a mais pra nós, a gente cata e vende, também deixa em casa pra comer...”, além da comercialização do produto, ele também é alimento para as famílias das catadoras.

Hoje a Associação das Marisqueiras é um movimento forte na busca de direitos e valorização do trabalho dessas mulheres que exercer outras atividades enquanto grupo.   

“Nós hoje conseguimos muita coisa, vem o pessoal dos projetos, a também corre atrás, sempre aprende uma coisa nova, a gente trabalha com o artesanato e nossa horta, vai pra cidade na Universidade vender nossas coisas e as pessoas saber que a gente tá aqui.”
Maria Luiza Sousa Santos, Marisqueira ilhagrandense.

O marisco ainda é um produto pouco comercializado, a própria culinária não valoriza muito, quantos restaurantes na nossa região apresentam o marisco no seu cardápio?

Tendo isso em vista elas criaram o festival do marisco, um evento onde apresentam toda uma culinária do seu produto com pratos feitos exclusivamente do marisco “No festival do marisco a gente faz tudo dele, faz um creme, torta, ele torrado com farofa... e todo mundo que vem gosta, as pessoas de fora gostam muito.”

É importante ressaltar, que o trabalho dessas mulheres se mantém forte pela vontade e pelo oficio que elas exercem. Dona Luiza que foi presidente da associação por muito tempo, diz que todo esse período sempre participava de eventos em busca de melhorias que trouxessem o reconhecimento para o trabalho delas: “eu já participei de muita coisa, das reunião que tinha, as meninas já viajaram pra congresso sempre tentando trazer uma novidade pra gente melhorar aqui”.

Hoje a associação é visitada por muitos grupos, universitários, ONG’s... dona Luiza diz que essa troca é benéfica para elas, por que elas aprendem sobre muitas coisas e as pessoas passam a conhecer o trabalho delas:

 “Vem muita gente atrás de nós, estudantes fazendo pesquisa, pessoal das ONG’s, gente querendo conhecer o que a gente, ajudar o nosso trabalho, tem os grupos que traz palestras, as meninas que faz brincadeiras com as crianças pra gente isso é muito bom por que a gente aprende muito as pessoas conhecem a gente e também ajudam a gente com projetos."
Maria Luiza Sousa Santos

Um prêmio recente que a associação conquistou, foi o prêmio de inclusão social, numa troca de conhecimentos com o coletivo feminista Mulheres em Pauta, que tem como objetivo o empoderamento e informação, para o beneficiamento do produto das marisqueiras, além da comercialização do marisco, elas passaram a comercializar o pó feito das cascas de mariscos, que são residuais do trato do produto, as cascas são trituradas e comercializadas, o pó das cascas se torna um adubo bastante eficaz.

“Eu gostaria de agradecer esse prêmio porque nosso serviço é muito difícil, a gente depende da maré, eu faço isso há 18 anos e garanto que no meio das novas não estou perdendo muito para elas não”,
Fala de dona Luiza ao receber esse prêmio.

Precisamos aprender a conhecer e valorizar os ofícios da nossa região, principalmente das mulheres, o ato de mariscar está em nossas tradições, diz muito sobre nossa identidade, sobre o que somos. Reconhecer o trabalho dessas mulheres é reconhecer o que nos faz ilhagrandenses.
Parabéns as nossas mulheres das águas!


Ilha Grande - PI,  31 de março de 2020.

Dos Autores em quarentena

Para o povo em quarentena.




Fotos do arquivo pessoal de Janaina Leocadio, mostrando dona Luiza, nossa entrevistada, no processo de beneficiamento do marisco. 



quarta-feira, 25 de março de 2020

O futuro do trabalhador autônomo ilhagrandense

       

 “Nas crises comerciais são destruídas regularmente não apenas uma grande parte dos produtos fabricados, como também das forças produtivas já criadas. Nas crises irrompe uma epidemia social que teria parecido absurdo em épocas anteriores – a epidemia da superprodução. Repentinamente, a sociedade parece retornar a uma situação de barbárie momentânea; como se a fome, uma guerra de extermínio geral, tivesse privado de todos os meios de subsistência; como se a indústria e o comercio tivessem sido destruídos. E por quê? Porque ela possui muita civilização, muitos meios de subsistência, muita indústria, muito comércio. As forças produtivas, que estão à sua disposição, não servem mais como estimulo da civilização burguesa e das relações burguesas de propriedade; ao contrário elas se tornaram muito fortes para essas relações, e são por elas contidas; tão logo elas rompam essas travas, toda a sociedade burguesa é lançada na desordem ameaçando a existência da propriedade burguesa.” Esse texto, meu amigo leitor, é de Karl Marx, filósofo, sociólogo, historiador, economista, jornalista e revolucionário socialista; e com a ajuda dele o Carta irá, hoje, tecer breves comentários sobre: o futuro do trabalhador autônomo Ilhagrandese.


Entendemos como trabalhador autônomo Ilhagrandese a pessoa que: 1) mora em Ilha Grande e trabalha de forma autônoma em Ilha Grande ou cidades vizinhas, como Parnaíba e Luiz Correia;
2) mora nas cidades vizinhas, mas faz o emprego da sua força de trabalho, de forma autônoma, em Ilha Grande.

Conversamos com Carlos Barros, empresário ilhagrandense, dono da Pizzaria Dom Luíz. Ele que atende uma média semanal de 150 à 300 clientes, dependendo da temporada, se vê em um momento decisivo para a continuidade de seu empreendimento, pois prevê uma queda de 70% nas vendas.

“O Cenário é preocupante, pois precisamos das vendas e assim garantir o pagamento dos funcionários, aluguel, água, luz e nossas despesas pessoais.”
Carlos Barros.

A pizzaria conta com 5 funcionários e Carlos vai fazer rodízio para que todos possam continuar trabalhando, e para isso ele conta com um novo formato de vendas: Já adotamos a estratégia de atender somente por entregas.

O Delivery, é o sistema de entregas à domicílio, e já vinha fazendo parte da rotina de muitos restaurantes, lanchonetes e comércios; ele pode ser um dos formatos de vendas do estabelecimento ou pode ser contratado de forma independente, como os aplicativos aiqfome e Ifood, que se encarregam de fazer a entrega de produtos de forma independente. 


“Como a burguesia supera as crises? Por um lado, com a aniquilação forçada de uma massa de forças produtivas; por outro lado, com a conquista de novos mercados e a exploração mais sistemática dos velhos mercados. Mas de que modo? Preparando crises mais universais e mais fortes, e reduzindo os meios de preveni-las”.


          No trecho acima, Marx explica o que os donos de empresas precisam e irão fazer: “... aniquilação forçada de uma massa de forças produtivas..., ou seja muitos irão perder seus empregos (guarde aqui: caixas de supermercados, atendentes de lojas). “... conquista de novos mercados ...”, o delivery é um exemplo. “... exploração de velhos mercados”, as pizzarias, lanchonetes e comércios, que são estruturas físicas e que não tiverem como adotar esse formato de maneira autônoma, ficarão suscetíveis a contratar empresas de delivery independentes.

Mas de que modo? Preparando crises mais universais e mais fortes, e reduzindo os meios de preveni-las”. Para exemplificar essa última parte, usaremos as conversas com Rebeca Andrade, Guilherme Jorge, Patrícia Cruz e Gleisson Souza. Os quatro são trabalhadores autônomos e usam principalmente Ilha Grande e Parnaíba, para fazer a oferta de seus serviços.

A microempreendedora parnaibana, Rebeca Andrade é artesã do ramo da costura e já faz entregas em Ilha Grande desde o início do Ateliê Alternativo, há 5 anos. Ela usa vários artifícios para expandir suas fronteiras de venda, como a entrega à domicilio, propaganda virtual (redes sociais) e o uso da máquina de cartões, para ofertar opções de pagamento e comodidade ao cliente.

“Com a demanda de encomendas crescendo, e muitas vezes as pessoas desistiam de encomendar devido ao local de retirada ser um pouco longe. Vi a necessidade de fazer entrega, combinei com meu companheiro dele me ajudar nessa questão, pois na época não tinha transporte ainda. E por meio das vendas consegui comprar uma moto, e a oferta da entrega já era algo natural, pois o que muitos gostam é da comodidade de receber seu produto em casa.”
Rebeca Andrade.

Rebeca aposta que, a comodidade do cliente será uma das ofertas mais importantes no desenvolvimento das novas formas de trabalho, principalmente o trabalho autônomo, e com a possibilidade do avanço do Corona, haverá uma supressão da forma como lidamos com o dinheiro (capital em forma física).

“O uso da maquininha já era frequente e segundo orientação da OMS (organização mundial da saúde), as cédulas de dinheiro podem disseminar o corona vírus, e o melhor para o momento é o uso dos cartões de crédito e/ou débito. Então a demanda pode aumentar significativamente para conter a proliferação da doença e melhorar a comodidade do cliente. Sem falar que o dinheiro recebido pela máquina de cartão cai em um dia útil! Muito bom né?”
Rebeca Andrade.

Para garantir que seus produtos sejam vendidos, outra estratégia é a divulgação, o marketing virtual.

“O uso das redes sociais é o meu aliado nesse ramo. Fazer postagens de qualidade e diárias, para que o engajamento não caia, se preocupar sempre com o que as pessoas acham do serviço ofertado, procurar melhorar em todos os aspectos, oferecer brindes para clientes contínuos, dá a certeza que eles ajudam na divulgação; fazer parcerias com outras pessoas, sorteio via instagram, promoções e descontos também aumentam o alcance da rede de clientes.”
Rebeca Andrade.

Guilherme Jorge, fundador e sócio da microempresa ilhagrandense FG TECH - soluções em informatica, presta serviços de assistência técnica e suporte de computadores, micro computadores e smartphones em Ilha Grande, Parnaíba e Luiz Correia. Ele acredita que seu mercado não será o mais afetado, por um lado, as pessoas passando mais tempo em casa necessitarão de ajustes em seus computadores e celulares; por outro lado, ele explica que, o modelo delivery de busca e entrega, já era o formato mais comum da prestação de seu serviço. Mas se preocupa, segundo ele, com “a probabilidade das baixas da economia” e continuará trabalhando no período de quarentena, porém vai redobrar os cuidados.

“Vou usar máscaras e álcool gel, manter o distanciamento de 1 metro e sem contato físico. As recomendações feitas”.
Guilherme Jorge.

Aproveitamos que ele é formado em história pela Universidade Estadual do Piauí - Parnaíba e perguntamos sobre: como ele vê a mudança, que está acontecendo e que a maioria não percebe, a revolução do modo em que usamos o “dinheiro”?

Basicamente já estávamos em transição com as transações on-line, agora vai só aumentar”.
Guilherme Jorge.

Rebeca e Guilherme seguem em uma mesma linha de pensamento, relacionada às suas ofertas de serviços, e fazem parte de um grupo que, embora sofra com o déficit do mercado atual, já buscava interagir com as tecnologias, visando o aprimoramento da sua autonomia, desde o início de suas carreiras.

Patrícia Maria Cruz, que também faz parte do microempreendedor Ilhagrandese, porém por mais tempo que Rebeca e Guilherme. Ela faz bolos confeitados para as datas comemorativas, desde os ano 90 e conta com clientes fiéis, ilhagrandenses e parnaibanos. Com o avanço da pandemia, já pensa em aplicar a opção de pagamento no cartão de crédito e débito, para dar opções ao cliente e pensando na baixa circulação de notas no pós quarentena, porém se vê ameaçada por não ter um sistema de entrega.

Para ela, o fato de o período da quarentena coincidir com o pico de procura por seus bolos e a condição das pessoas estarem em casa; são lembretes de Deus para a tradição cristã do final da quaresma. Dona Patrícia lembra que na sua infância/adolescência, os costumes de se recolher em casa, não fazer vendas (alguns tinham receio até de tocar nas cédulas de dinheiro e de tomar banho), ser solidário ao próximo e passar mais tempo com a família em oração; eram fortes, e que essa freada no sistema capitalista, irá fazer as pessoas reatarem com hábitos antigos. Mas deixa de perceber o quanto o sistema capitalista permeia sua vida.

Quisemos saber, se ela pretende fazer os famosos bolos dos jejuns da Sexta-feira Santa, e ela responde:

“Vou vender bolo na Semana Santa, é o jeito né? O quê que a gente pode fazer? É o único meio de ganhar dinheiro é esse, tem que vender.”
Patrícia Cruz.

                       “A burguesia arrancou das relações familiares seu véu pungente e sentimental, transformando-as em uma mera relação de dinheiro.”
Karl Marx.

Gleisson Souza tem 23 anos e trabalha como garçom nos bares e restaurantes de Parnaíba e Ilha Grande, já trabalhou de forma autônoma, esporádica e informal, mas no início do ano conseguiu contrato fixo. Ele hoje se questiona sobre, como será o tratamento de seu patrão com relação a quarentena, e como isso vai implicar no pagamento de seu salário.

“Preocupado, não por mim, porque mesmo eu doente, eu não vou no hospital, mas minha filha sim. Me preocupo pela minha filha que tá por vir esse mês e tá acontecendo tudo isso...”
Gleisson Souza.

“Os custos gerados pelo trabalhador limitam-se, portanto, quase apenas aos meios de subsistência necessários para o seu sustento e sua reprodução”.
Karl Marx.

Nosso amigo será pai em breve, com expectativas para esse mês (março/2020), será um momento abençoado, no entanto carregado de preocupações. Para prevenir, ele já pensa em maneiras de garantir a renda familiar e investe em propagandas para a aplicação de um sistema que visa explorar o delivery. Indo fazer as compras para as pessoas que estão em quarentena e quando tudo passar, ele aposta no desejo de comodidade dos dias atuais.

Muito provavelmente, pessoas como Dona Patrícia e Gleisson, formarão pares ou conjuntos complexos de prestações de serviços conjugadas, e vão se ocupar em deixar as pessoas, cada vez mais dentro de casa.  

Lembra disso: (guarde aqui: caixas de supermercados, atendentes de lojas)? Pois é.

 “Nas crises comerciais são destruídas regularmente não apenas uma grande parte dos produtos fabricados como também das forças produtivas já criadas.”

 Caixas e atendentes são exemplos de “... forças produtivas...” que inevitavelmente serão, cada vez menos usuais, e para não perderem o seguimento, pessoas do setor passarão de forma gradual para o novo mercado, porém nem todos terão essa oportunidade. Não preciso recorrer aos acendedores de postes, telefonista ou os barqueiros que, antes da construção da ponte Simplício Dias, se encarregavam da travessia, para mostrar ao leitor que o modo de trabalho é dinâmico.

O conceito de Desemprego Estrutural é justo aquele trabalhador que perdeu seu trabalho para os avanços da tecnologia, ele garante a formação continua de Exército de Reserva, que por sua vez, é a massa de trabalhadores desempregados, que aceitariam qualquer forma de trabalho/pagamento sujeitando-se ao subemprego e a desvalorização de sua classe. Essa mudança é inevitável, pois é condição para a manutenção do capitalismo burguês e é o que congela o valor do salário, mas esse avanço terá uma aceleração inimaginável para o trabalhador e a falta dessa informação deixará muitos para trás. Pense ai, seu trabalho pode ser feito por uma máquina?
               



Ilha Grande – PI, 25 de março de 2020.


Dos autores em quarentena

Ao povo em quarentena.

                                                   Divulgação da pizzaria Dom Luiz
                                         Postagem sobre o sistema delivery da pizzaria


Banner Ateliê Alternativo - Rebeca Andrade


Cartão de visita da FG TECH - soluções em informatica


Apresentação dos bolos a pronta entrega de Patrícia Cruz



Post de Gleisson Souza



























sexta-feira, 20 de março de 2020

Coronavírus e o efeito na economia ilhagrandense

       
O Turismo contra o COVID-19

Crédito da foto: Omega Energia.
Vista aérea de Ilha Grande, podemos ver o avanço das duna como uma onda, que  assim como o vírus, assusta uma parte da população.


           Segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em junho de 2019 o número de profissionais autônomos no país somava 24 milhões, mas isso leva em consideração os autônomos registrados. Na mesma pesquisa, os profissionais sem carteira assinada chegavam a 11,4 milhões. Desde 2012, o Brasil supera a cada ano as taxas anteriores de empregos informais e durante o  governo atual, o empreendedorismo informal tem recebido elogios, sendo  considerado um benefício para a população e uma solução para o desemprego que atinge mais de 12 milhões de brasileiros.
         
           Em Ilha Grande, os autônomos compõem a maioria  dos setores. Desde o artesanato; o comércio; o setor de alimentos, agricultura e pesca, da produção à venda; o entretenimento; a prestação de serviço e o ramo turístico, que ganhou destaque e acompanhou os saltos da geração de empregos informais nesses últimos anos. Grande parte desses trabalhadores, segue de forma independente e distante de qualquer seguridade social .

           Os autores do Carta Ilhagrandese, a fim de analisar os impactos gerados pela atual situação pandêmica na economia da Ilha, trará entrevistas com os representantes  municipais, empreendedores e trabalhadores da nossa cidade, no intuito de discutir e refletir sobre as consequências na rotina do cidadão ilhagrandense.  Entramos em contato, via aplicativo de comunicação, com o Secretário Municipal de Turismo Adilson Castro. Bacharel em Turismo pela Universidade Federal do Piauí e profissional do ramo,  ele expôs  suas opiniões acerca do problema. Leia a entrevista completa:

Autores - Na sua visão, quais vão ser os principais pontos negativos do efeito quarentena no movimento turístico?

Adilson – Bom, com a suspensão da atividade turística por 15 dias no Delta do Parnaíba, a gente entende que um dos principais problemas é o aspecto econômico. Por mais que estejamos em um período de baixa temporada, ainda sim, teria uma tendência de visitação que, por mais que pontual, era o que daria uma renda para as pessoas que trabalham na atividade turística, desde o condutor ao dono da embarcação, até mesmo as grandes empresas. Entendemos que com a suspensão da atividade, o principal ponto a ser afetado é o aspecto econômico.

Autores – A prefeitura, por meio da Secretaria de Turismo, tem algum plano para amortecer o impacto na vida do novo empreendedor do ramo do turismo?

Adilson – A Secretaria de Turismo de Ilha Grande vem buscando nesse primeiro momento, compreender algumas políticas públicas, algumas ações que estão sendo criadas nesse momento via Ministério do Turismo, para que possam minimizar diretamente os impactos negativos, principalmente nos pequenos e médios empresários.
Então, o Ministério do Turismo vem fazendo um apontamento na possibilidade de facilitar o acesso à linha de créditos, principalmente via FUNGETUR (Fundo Geral de Turismo) e com juros mais reduzidos. Então, nós buscaremos entender melhor, como vai se dar essas ações, para que a gente possa estar fazendo o repasse das informações aos empresários do ramo do turismo que atua em nossa cidade.

Autores – Qual sua análise do problema, você já sente alguma mudança?

Adilson – Minha análise em quanto Bacharel em Turismo, Secretário Municipal e profissional do setor: eu não tenho dúvidas que esse, provavelmente, será um dos piores anos para atividade turística no município de Ilha Grande e da região do Delta do Parnaíba. Compreendemos que estamos em um período de baixa temporada e que teria uma tendência de aumentar a visitação a partir de junho ou julho. Temos um período de pico: julho, agosto e setembro, principalmente agosto e setembro com o período de visitação de estrangeiros e não tenho dúvida que esses meses, eles serão afetados diretamente, em detrimento dessa pandemia do COVID-19.
                O que nós podemos fazer é, após passarmos por esse período de turbulência, intensificar um planejamento turístico, intensificarmos ações de marketing para que a gente possa, de fato, dar uma seguridade para visitante. Para que ele possa estar vindo visitar nossa região e se Deus quiser, a gente possa estar livre dessa pandemia, que assombra não só o município de Ilha Grande, como assombra hoje, infelizmente, todo mundo.

Autores – Os guias turísticos, pilotos e donos de embarcações, têm vínculos que garantem seguridade nesses casos?

Adilson – Um ponto importante a acrescentar, é que a decisão que nós tomamos em suspender a visitação turística, se dá pelo fato de hoje, no município de Ilha Grande, nós termos um sistema de controle de visitação turística chamado Voucher Eletrônico e por meio dessa tecnologia, nós conseguimos ter dados dessa visitação de maneira geral. Então, como nós percebemos que os países estrangeiros com maior emissão, são França e Itália principalmente. Nós realmente, tivemos subsídios suficiente para que pudéssemos discutir com o setor e mostrar a importância da suspensão da atividade turística nesse período. Outro ponto tocante, é que o turista nacional está vindo, principalmente de São Paulo, fortaleza e outros pontos que já existem casos confirmados do COVID-19. Então seria um ato irresponsável da gestão municipal, se nós permitíssemos que a atividade turística continuasse no modo que está, pois colocaríamos em risco a vida, a saúde, não só daqueles funcionários do turismo, como toda população de Ilha Grande.
                Completando a resposta. O governo federal fez um apontamento de possibilidades de liberação de um valor de R$ 200,00 (duzentos reais) por pessoa, por autônomo, e vamos verificar se os funcionários do turismo estão inseridos dentro dessa possibilidade de acesso a esse valor. A gente entende que, é um valor relativamente baixo, mas que pode estar ajudando esses profissionais. Vamos estar fazendo contato direto com o Governo Federal para buscar entender de fato, quem são os profissionais envolvidos, e dai vamos fazer o repasse das informações para os profissionais autônomos do município.                 

                A maioria dos profissionais que trabalham no setor do turismo em Ilha Grande, trabalham de maneira autônoma. E realmente eles ficam descobertos por qualquer seguridade social, acesso ao seguro desemprego ou qualquer outra situação, tendo em vista que a grande maioria trabalha como autônomos, ou seja, eles trabalham por conta própria.

              Adilson, que em reportagem da TV Club na data de hoje, reafirmou a importância do Voucher Eletrônico mostrando dados sobre o número de visitantes da cidade, onde o turista nacional se destaca com 12.132, mas vem seguido por França (60) e Itália (34), os país mais afetados até o momento.

            O Carta conversou também com Ian Bitencourt, empreendedor e condutor turístico na empresa Antares Delta Turismo, que atualmente conta com 18 funcionários (segundo cadastro feito pela Prefeitura Municipal, através do Voucher Eletrônico em fevereiro de 2020, são um total de 92 guias/condutores de turismo e pilotos das embarcações que prestam serviços no Delta). Quando questionado sobre os pontos negativos da quarenta, Ian diz:

"Teremos que cancelar nossos passeios. Temos compromisso com nossos clientes em apresentar nosso paraíso, prestando serviço de qualidade e promovendo emoções. Deixaremos de fazer pessoas felizes aqui nos nossos passeios e também deixaremos de gerar renda para todos que dependem dessa atividade"

                  Ele conta, que já sente os efeitos da freada brusca no fluxo de passeios nos próximos dias e acredita que a quarentena afete todo o curso turístico anual, até mesmo a Rota das Emoções, que inclui Jericoacoara, Delta do Parnaíba e Lençóis Maranhenses, mas entende ser uma medida necessária.

 " São recomendações importantes a serem seguidas, necessitamos de um norte competente e o Ministério da Saúde é compostos de especialistas com méritos. 
Então todas as orientações são essenciais para que nossa sociedade possa sair dessa pandemia!
Todos precisam seguir essas valiosas recomendações!"



Ilha Grande - PI
 20 de março de 2020.

Dos Autores em quarentena
Para o povo em quarentena.




Postagem do Ministério do Turismo, sobre a linha de crédito.

Dados da Prefeitura Municipal de Ilha Grande com o número de visitantes do Delta.

Postagem do Ministério do Turismo pedindo que o turista não se afaste.

Entrega dos crachás de identificação dos profissionais do turismo no Porto dos Tatus

Todas as postagem podem ser lidas na integra em: http://www.facebook.com/AdilsonCastroOficial

Postagem da Antares Delta Turismo informando a suspensão das atividades.

Divulgação dos passeios ao Delta.


Você pode visitar a página oficial da Antares Delta Turismo em: https://www.facebook.com/antaresturismopasseioaodeltadoparnaiba/






quarta-feira, 18 de março de 2020

Sobre as Pastorinhas da Ilha




“Acorda chega à janela
Que o céu está estrelado
Os santos reis do oriente
Em vossa porta é chegada

Desperta de um grande leito
Abre a janela vem ver
Como são lindos os presente
Que viemos receber”.

        Acima vemos um trecho de uma das canções das Pastorinhas da Ilha. Como havíamos combinado, esse mês de março vamos homenagear, por meio de alguns grupos, as mulheres de Ilha Grande - PI.
As Pastorinhas da Ilha é uma grupo formado em sua maioria por mulheres, esse é o motivo de estarmos aqui contanto um pouco da história delas, que saem durante as noites do mês de Janeiro,  do dia primeiro ao Dia de Reis (06), visitando com muita  música e dança os lares da nossa cidade. Você certamente já deve ter tido o privilégio de presenciar alguma apresentação das pastorinhas ou até mesmo, tido o receio de ter a canção “Coração de pedra dura” cantada em sua porta por elas, enfim vamos conhecer um pouco dessa manifestação que deveria ser mais valorizada por nós, pois é algo que faz parte da nossa identidade quanto ilhagrandense.

          Ao sentarmos com dona Raimunda, apontada por vários munícipes das proximidades do Baixão como matriarca das pastorinhas, ela nos conta um pouco sobre como tudo começou. Segundo ela, sua mãe dera início as apresentações:

“Tudo começou pela minha mãe. Eu era nova, moça em casa e brinquei muito, depois me casei, ai tudo parou. Mas ela continuou né? Ai quando foi um tempo ela não aguentou mais botar, né? Ai eu me animei mais as outras meninas”

             É importante perceber, que as pastorinhas foi algo repassado de mãe para filha de forma espontânea, pelo desejo de diversão. Muitas de nossas avós casaram-se cedo demais, talvez essa fosse uma forma delas se distanciarem um pouco do lar, uma vez que a grande maioria delas são donas de casa. E mesmo com o desafio de cuidar do lar e da família, tinham o prazer de sair de suas casas a noite, cantando e dançando nos lares ilhagrandenses.

              Ao ser perguntada como se sente hoje, vendo as pastorinhas saindo nas ruas, dona Raimunda fala: “Nada". Apesar dessa sua forma de falar, é possível perceber o tom de orgulho daquilo ao qual participava. Uma fala que veio com muito entusiasmo foi sobre o deslocamento do grupo para outros lugares: “Nesse tempo a gente andava de canoas para as Mangueiras, para as Batatas, pra culá tudo a  gente andava embarcado. Enchia a canoa de homens, os homens é quem iam remando e as mulheres todas sentadas.” E seu sentimento de nostalgia aparece na afirmação final da nossa conversa quando ela fala:

 “Quando eu brincava, a gente amanhecia o dia. Eu gostava. A gente amanhecia o dia na praça dos Morros da Mariana, todo mundo, as mulheres todas e os tocadores amanheciam o dia lá. Quando chegava em casa cada qual cuidava no que tinha pra fazer. Era boa a brincadeira.”


            Pela fala de nossa colaboradora, podemos chegar à conclusão, que aqueles tenham sido anos áureos para o grupo. Elas gostavam de participar, eram reconhecidas, convidadas para ir nesses lugares mais distantes, mas não podemos deixar de falar aqui, que muitas manifestações populares acabam sofrendo ou caindo no esquecimento com o tempo, pois diante de muitos outras novidades a perpetuação acaba se tornando um desafio, uma vez que a tradição vem sendo repassada de mãe para filho por meio da oralidade.

Na visão da nossa entrevistada, as meninas mais jovens não tem interesse em participar dessa brincadeira, “Não tem uma moça, não tem quem queira. Moça nenhuma não vai, vai aquele monte acompanhar, mas pra brincar não.” Ai deixo um questionamento para vocês, será que esse desinteresse por parte dos mais jovens por manifestações populares se dá pela falta de valorização com a nossa cultura ou será apenas o curso natural do preço que pagamos pelo mundo moderno?

            Continuando. Não poderia deixar passar, a importância do papel da mulher no lar dentro da Cultura, muitas de nossas avós e grande parte de nossas mães são apenas “do lar” e mesmo que esta exerça atividade fora de casa, as obrigações sempre lhes serão cobradas. Então muito do que nós aprendemos vem de nossas mães, isso é algo da nossa cultura patriarcal, e perceptível, quando vemos na fala de dona Raimunda como aprendeu com sua mãe e seu filho, o Sr. Lucio  também, em sua fala diz  o que aprendeu com ela, dona Raimunda “Eu com uns, 8 anos 10 anos, acompanhava ela. Ela tinha a turma dela. Eu fui ouvindo as músicas e eu fui aprendendo”

            Sr. Lucio e sua irmã Francinete, que atualmente não mora aqui, tem um grande conhecimento sobre as pastorinhas adquiridos da mãe. Hoje ele mantém a organização do grupo, incentiva as mulheres a participarem, e é o único homem que dança e canta no grupo, mas para sua participação ele se transfigura com as roupas que todas as outras usam.

             Após um período sem se apresentar, Lucio e sua irmã decidiram montar novamente o grupo, e retornar com as apresentações:

“Depois que a mamãe parou, ai ela ficou um tempo sem botar, ai minha irmã falou assim: 'Lucio, vamos botar as pastorinhas?' e eu falei 'Vamos, vamos combinar com as meninas', ai todas conhecidas daqui mesmo, e um convidou o outro, 'Ai nós vamos', ai se reuniu o grupo. Ai todo ano. Agora esse ano, estamos com uma promessa de um uniforme pra gente”.

          É importante ressaltar aqui sobre como o grupo se mantém, por que nosso intuito não é somente mostrar a história, é homenagear, e não há homenagem maior que o apoio!

           As pastorinhas sobrevivem da boa vontade daqueles que participam do grupo, elas que se organizam, compram tecidos e fazem seus figurinos, compram seus adereços e enfeites, contam com a ajuda de quem se oferece voluntariamente para tocar instrumentos para elas:

“Ai prometeram pra gente e tudo mais, mas nunca a gente conseguiu nada. Quando chega os 15 dias antes, a gente se reúne, escolhe o tecido que a gente vai usar, todo mundo dá uma opinião. Ai cada qual compra sua roupa e manda fazer. E é assim [...], somos um grupo independente. A gente nunca teve ajuda de órgãos assim.”

         Falta ainda por parte do poder público, o incentivo para nossas manifestações culturais, valorização daquilo que é nosso, porque não chamar no aniversário da cidade as pastorinhas para fazer uma apresentação e mostrar seu trabalho? Convidar uma marisqueira pra falar sobre suas vivências ou as rendeiras para mostra sua tradição? Devemos ver essas mulheres para além das figuras folclóricas, deveríamos aprender a vê-las como mulheres que fazem parte daquilo que Ilha Grande do Piauí é, como parte daquilo que somos.